Por Felipe Dutra
(Graduando em História – UERN – Universidade do Estado do Rio Grande do Norte).
No dia 13 de junho de 1927, foi endereçado as mãos do Prefeito de Mossoró a época a seguinte missiva do Coronel Antônio Gurgel do Amaral:
“Meu caro Rodolpho Fernandes. Desde ontem estou aprisionado do grupo de Lampião o qual está aqui aquartelado aqui bem perto da cidade, manda, porém, propor um acordo para não atacar mediante a soma de quatrocentos contos de reis. Posso adiantar sem receio que o grupo é numeroso cerca de 150 homens bem equipados e municiados a farta, creio que seria de bom alvitre você mandar um parlamentar até aqui que me disse o próprio Lampião seria bem recebido para evitar pânico e derramamento de sangue”.1
Falar sobre o fenômeno social Cangaço, ocorrido no nordeste brasileiro é desafiante. E ser de Mossoró no Rio Grande do Norte, tem um peso maior. Em 2023 completamos 96 anos de resistência ao ataque do bando de Virgulino Ferreira da Silva (mais conhecido como Lampião) em que sim, houve pânico e derramamento de sangue.
O fato histórico tem muitas camadas e tentaremos pontuar o acontecido. Quem passa pela Igreja São Vicente pode não ter tanta ciência de que aquele local junto com a “casa da esquina” e o que atualmente é o Palácio da Resistência, como outros pontos na cidade foi palco de uma guerra.
A guerra envolve um conflito armado entre pessoas, em que está em jogo interesses muitas vezes materiais. No conflito acontecido em Mossoró, no 13 de junho de 1927 temos de um lado os cangaceiros, do outro uma população temerosa sobre seu futuro.
É necessário falar do contexto da cidade nesse início\meio do século XX. A cidade se destacava no comercio; tinha agência do Banco do Brasil, telégrafo, linha férrea; colégios católicos; enfim algumas singularidades “modernas” para época. Estamos falando da realidade brasileira pós “libertação” dos escravizados em 1888 e instauração de uma recente República em 1889.
Com a recente República instituída, foi necessário criar e os cidadãos reconhecerem um conjunto de práticas e leis, que dessa vez não foi copiado de modelos europeus, mas sim norte-americano; a Constituição de 1891, que tirava a concentração do poder central e perante o federalismo, dava autonomia para os estados exercerem seus tramites políticos. É por meio dessa “distribuição e redimensionamento” do poder que vemos o surgimento da influência dos coronéis, estes que ditavam como a classe trabalhadora deveria comportar-se seja no ritmo da labuta, seja na vida social; em Mossoró temos como personagem o prefeito Rodolfo Fernandes.
É nessa intersecção de conjuntos sociais e políticos que o Cangaço se fez presente. Para uns bandidos, para outros heróis, são justos ou desordeiros; é essa dubiedade que nos instiga a discorrer sobre o tema. Para os oligárquicas os cangaceiros e cangaceiras representavam os transtornos, desordem; para a classe trabalhadora que vivia longe dos centros urbanos eles eram figuras que abalavam os pilares sociais.
Por fim, parafraseando o Historiador Pernambucano Jones Manoel “imagina que perigo o povo trabalhador ter uma imagem positiva de pessoas armadas matando latifundiários. Nesse país, no campo, só quem pode ter armas e se organizar para ações armadas são os latifundiários”.
__________________
ACOMPANHE MAIS DA PROGRAMAÇÃO DA RÁDIO DIFUSORA DE MOSSORÓ (AM 1170) aqui.
© DIFUSORA – A FALA DO POVO!
1 https://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2020/06/02/93-anos-depois-carta-que-representa-resistencia-de-mossoro-ao- bando-do-cangaceiro-lampiao-e-encontrada.ghtml